para a Dolores
Sandra Izbasa
Apesar da beleza da juventude e do movimento perfeito falta a luz limpa da poesia. Se tudo isto se movesse no silêncio de um campo fresco de primavera, só com pássaros e águas de ribeiro. Sem a roupa que cobre a essência. O idealismo é louco e perigoso.
Ana Paula Ribeiro Tavares
Não conheço nada do país do meu amado
Não sei se chove, nem sinto o cheiro das
laranjas.
Abri-lhe as portas do meu país sem perguntar nada
Não sei que tempo era
O meu coração é grande e tinha pressa
Não lhe falei do país, das colheitas, nem da seca
Deixei que ele bebesse do meu país o vinho o mel a carícia
Povoei-lhe os sonhos de asas, plantas e desejo
O meu amado não me disse nada do seu país
Deve ser um estranho país
o país do meu amado
pois não conheço ninguém que não saiba
a hora da colheita
o canto dos pássaros
o sabor da sua terra de manhã cedo
Nada me disse o meu amado
Chegou
Mora no meu país não sei por quanto tempo
É estranho que se sinta bem
e parta.
Volta com um cheiro de país diferente
Volta com os passos de quem não conhece a pressa.
Poeta angolana, 1952-
Nota: Que bom, nada é revolta. Finalmente.
Não sei se chove, nem sinto o cheiro das
laranjas.
Abri-lhe as portas do meu país sem perguntar nada
Não sei que tempo era
O meu coração é grande e tinha pressa
Não lhe falei do país, das colheitas, nem da seca
Deixei que ele bebesse do meu país o vinho o mel a carícia
Povoei-lhe os sonhos de asas, plantas e desejo
O meu amado não me disse nada do seu país
Deve ser um estranho país
o país do meu amado
pois não conheço ninguém que não saiba
a hora da colheita
o canto dos pássaros
o sabor da sua terra de manhã cedo
Nada me disse o meu amado
Chegou
Mora no meu país não sei por quanto tempo
É estranho que se sinta bem
e parta.
Volta com um cheiro de país diferente
Volta com os passos de quem não conhece a pressa.
Poeta angolana, 1952-
Nota: Que bom, nada é revolta. Finalmente.
Lavínia Saad - Sermão
Eu, que me deleitava com migalhas,
Hoje cobiço a padaria.
Poetisa brasileira, 1975-
Hoje cobiço a padaria.
Poetisa brasileira, 1975-
Antonio Vivaldi - Gloria em Ré maior, RV 589
Antonio
Lucio Vivaldi compôs a obra Gloria em Veneza, provavelmente em 1715, para o
coro do Ospedale della Pietà.
- Gloria in excelsis Deo (Chorus)
- Et in terra pax (Chorus)
- Laudamus te (Sopranos I and II)
- Gratias agimus tibi (Chorus)
- Propter magnam gloriam (Chorus)
- Domine Deus (Soprano)
- Domine, Fili unigenite (Chorus)
- Domine Deus, Agnus Dei (Contralto and Chorus)
- Qui tollis peccata mundi (Chorus)
- Qui sedes ad dexteram Patris (Contralto)
- Quoniam tu solus sanctus (Chorus)
- Cum Sancto Spiritu (Chorus)
Adília Lopes - Fedra está apaixonada
Fedra está apaixonada por Hipólito
Hipólito não está apaixonado por Fedra
Fedra enforca-se
Hipólito morre num acidente
Dido está apaixonada por Eneias
Eneias não está apaixonado por Dido
Dido oferece uma espada a Eneias
Eneias esquece-se da espada quando se vai embora
Dido suicida-se
com a espada esquecida por Eneias
Um desgosto de amor
atirou-me para um curso de dactilografia
consolo-me a escrever automaticamente
o pior são os tempos livres.
Adília Lopes
Fedra enforca-se
Hipólito morre num acidente
Dido está apaixonada por Eneias
Eneias não está apaixonado por Dido
Dido oferece uma espada a Eneias
Eneias esquece-se da espada quando se vai embora
Dido suicida-se
com a espada esquecida por Eneias
Um desgosto de amor
atirou-me para um curso de dactilografia
consolo-me a escrever automaticamente
o pior são os tempos livres.
Adília Lopes
Nota: Ser escravo-robô para não lembrar.
Regra
A amizade é um pacto, uma convenção. Dois seres comprometem-se tacitamente a nunca esclarecer o que no fundo cada um pensa do outro. Um espécie de aliança à base de negociações. Quando um deles expõe em público os defeitos do outro, o pacto é denunciado, a aliança rompida. Nenhuma amizade dura se uma das partes deixa de jogar o jogo. Por outras palavras, nenhuma amizade suporta uma dose exagerada de franqueza.
Emil Cioran
Nota: Não deixa de ser verdade, mas o primeiro verbo da citação deveria ser ter e não ser.
Eeva Kilpi
Quando alguém já não tem forças para escrever, tem de recordar.
Quando já não tem forças para fotografar,
tem de ver com os olhos da alma.
Quando já não tem forças para ler,
tem de estar repleto de histórias.
Quando já não tem forças para falar,
tem de ecoar.
Quando alguém já não tem forças para andar, tem de voar.
E quando chega a hora,
tem de se desprender das recordações
e dos olhos da alma e deixar de ressoar,
calar-se e dobrar as asas.
Mas aconteça o que acontecer a história continua, continua.
in, Poesía nórdica
Nota: Não sabemos.
Quando já não tem forças para fotografar,
tem de ver com os olhos da alma.
Quando já não tem forças para ler,
tem de estar repleto de histórias.
Quando já não tem forças para falar,
tem de ecoar.
Quando alguém já não tem forças para andar, tem de voar.
E quando chega a hora,
tem de se desprender das recordações
e dos olhos da alma e deixar de ressoar,
calar-se e dobrar as asas.
Mas aconteça o que acontecer a história continua, continua.
in, Poesía nórdica
Nota: Não sabemos.
Danila Stoyanova
O rapaz matou um pato
com uma pedra
mas não se apercebeu.
O pato não deu conta de nada
porque ficou morto.
Os outros patos nadaram
debaixo de água
os pecoços esticados para baixo.
Isto aconteceu mesmo?
Ninguém sabe
porque ninguém viu.
in, Young poets of a new Bulgaria
Nota: O mal oculto.
com uma pedra
mas não se apercebeu.
O pato não deu conta de nada
porque ficou morto.
Os outros patos nadaram
debaixo de água
os pecoços esticados para baixo.
Isto aconteceu mesmo?
Ninguém sabe
porque ninguém viu.
in, Young poets of a new Bulgaria
Nota: O mal oculto.
El lado oscuro del corazón
'Nunca veas a una puta con luz de día, es como mirar una película con la luz encendida. Como el cabaret a las diez de la mañana, con los rayos de sol atravesando el polvo que se levanta cuando barres. Como descubrir que ese poema que te hizo llorar a la noche, al día siguiente apenas te interesa. Es como sería este puto mundo si hubiera que soportar las cosas tal y como son. Como descubrir al actor que viste haciendo Hamlet en la cola del pan. Como el vacío cuando te pagan y no sentís ni siquiera un poquito. Como la tristeza cuando te pagan y sentiste por lo menos un poquito. Como abrir un cajón y descubrir una foto de cuando la puta tenía nueve años. Como dejarte venir conmigo sabiendo que cuando se acabe la magia vas a estar con una mujer como yo, en Montevideo.'
in, Lavorare Stanca
Vinícius de Moraes - A anunciação
Virgem! filha minha
De onde vens assim
Tão suja de terra
Cheirando a jasmim
A saia com mancha
De flor carmesim
E os brincos da orelha
Fazendo tlintlin?
Minha mãe querida
Venho do jardim
Onde a olhar o céu
Fui, adormeci.
Quando despertei
Cheirava a jasmim
Que um anjo esfolhava
Por cima de mim...
De onde vens assim
Tão suja de terra
Cheirando a jasmim
A saia com mancha
De flor carmesim
E os brincos da orelha
Fazendo tlintlin?
Minha mãe querida
Venho do jardim
Onde a olhar o céu
Fui, adormeci.
Quando despertei
Cheirava a jasmim
Que um anjo esfolhava
Por cima de mim...
6
cheia
da lentidão das facas
a tua sombra
a cortar o tempo.
gil t. sousa
Porque o ser humano não desliga como o interruptor da luz. E neste caso é só a sombra que fere, o que pode ser bem mais doloroso.
Porque o ser humano não desliga como o interruptor da luz. E neste caso é só a sombra que fere, o que pode ser bem mais doloroso.
Camilo Castelo Branco
Vamos fechar este capítulo.
- Com que lance dramático? – pergunta o leitor.
- Nenhum! – respondo eu.
E vai ele, replica:
- Porque não inventaste um encapotado, que viesse perturbar este festim, como o Mane Tacel Phares de Baltasar?
- Era uma invenção lorpa – respondo eu.
- Pois não houve mais nada!? – torna o importuno.
Houve o seguinte:
O menino que fazia anos, meteu-se na capoeira das galinhas e degolou-as todas!
Acaba melhor do que eu imaginara.
- Nenhum! – respondo eu.
E vai ele, replica:
- Porque não inventaste um encapotado, que viesse perturbar este festim, como o Mane Tacel Phares de Baltasar?
- Era uma invenção lorpa – respondo eu.
- Pois não houve mais nada!? – torna o importuno.
Houve o seguinte:
O menino que fazia anos, meteu-se na capoeira das galinhas e degolou-as todas!
Acaba melhor do que eu imaginara.
in, Anátema
Curioso diálogo entre o escritor-narrador e o leitor. Matar as galinhas todas naquela época era a festa de encher os estômagos. Anátema seria vir o encapotado.
James Taylor - Fire and Rain
Cada um de nós conhece bem o fogo e a água. Na vida foram absolutos. E quando estas canções simples nos trazem de volta os momentos, paramos o olhar em qualquer ponto. É tarde.
Raúl Brandão
Fan Ho - Approaching Shadow
Da existência ficara-lhe o olhar desvairado, para dentro, de quem segue na alma um sonho e anda na vida por acaso, o olhar daqueles em quem a vida interior é enorme e que ficam surpreendidos quando a dor lhes diz que o mundo existe.
Raúl Brandão
Eugénio de Andrade - Três ou quatro sílabas
Neste país
onde se morre de coração inacabado
deixarei apenas três ou quatro sílabas
de cal viva junto à água.
deixarei apenas três ou quatro sílabas
de cal viva junto à água.
É só o que me resta
e o bosque inocente do teu peito
meu tresloucado e doce e frágil
pássaro das areias apagadas.
e o bosque inocente do teu peito
meu tresloucado e doce e frágil
pássaro das areias apagadas.
Que estranho ofício o meu
procurar rente ao chão
uma folha entre a poeira e o sono
húmida ainda do primeiro sol.
procurar rente ao chão
uma folha entre a poeira e o sono
húmida ainda do primeiro sol.
Do livro, Véspera da Água, de 1973. 'Inacabado' é o conhecimento e a obra que se desejou fazer, completo é o coração que ama um país. Custa-me sempre ler o prefixo, até porque a seguir está o legado de Eugénio 'deixarei apenas três ou quatro sílabas de cal viva junto à água.'
Joan Baez
A voz, o verso, o dedilhar, a convicção, o sorriso. Conta-se, que certa vez Joan levou a guitarra a uma loja de restauro e só ao fim de muitos anos descobriu que escondido debaixo do tampo estava escrito a lápis 'Too bad you're a communist!'. Nada disso interessou, muito menos nestas três canções.
Vincent Van Gogh - Branches Of An Almond Tree In Blossom
A primavera é verde, mas também se renasce com o fogo que não se vê. Lembro-me do tempo em que juntava um mais um e somava o infinito.
Diálogos
Um homem caminha na minha direcção.
Traz o coração a bater nas mãos.
Aproxima-se de mim, estende-as e diz:
- Por favor, faça com que páre.
Não chegaste a ouvir,
mas, antes de partir, disse-te
que passaria o resto da vida a tentar
sair do lugar que deixei.
Marta Chaves in, Dar-te amor e tirar-te a vida
Traz o coração a bater nas mãos.
Aproxima-se de mim, estende-as e diz:
- Por favor, faça com que páre.
Não chegaste a ouvir,
mas, antes de partir, disse-te
que passaria o resto da vida a tentar
sair do lugar que deixei.
Marta Chaves in, Dar-te amor e tirar-te a vida
Daniel Huenergardt
A técnica free-viewing permite ver três imagens em vez de duas. É descrita assim em Artodyssey: 'Stare at the painting and then cross your eyes so you see three images. Focus on the middle one. Relax your eyes a bit - be patient - you will lock it in like a tractor beam. Once you get it the first time it will becomes much easier. Move your head side to side and the piece will actually turn toward you.'
As orquídeas
Foi um erro substituir
por orquídeas
as flores artificiais
no centro da mesa.
Exigem luz, cuidados,
uma humidade temperada.
Bem as conheço:
flores venenosas
donas de uma beleza gratuita.
Às outras bastava passar
o pano do pó às vezes,
nem olhava para elas,
para as suas folhas baças,
para os seus ramos secos de arame;
estas ensinam-me, com esplendor, a tua morte,
a ferida com que o mundo vai acabar.
Luís Filipe Parrado
Paul McCartney - Always
White Christmas e God Bless America são melodias que eternizam Irving Berlin, entre muitas outras. De entre essas, Paul McCartney escolheu Always que no refrão relaciona o tempo eterno com os afectos eternos: 'Days may not be fair always, that's when I'll be there, always. Not for just an hour, not for just a day, not for just a year, but always.' Paul justifica a escolha dizendo, que a canção era cantada pelos pais na noite da passagem de ano.
Maria do Rosário Pedreira - Guarda tu
Guarda tu agora o que eu, subitamente, perdi
serenamente e sem pressa, como eu nunca soube.
E protege-o de todos os invernos ― dos caminhos
de lama e das vozes mais frias. Afaga-lhe
as feridas devagar, com as mãos e os lábios,
para que jamais sangrem. E ouve, de noite,
a sua respiração cálida e ofegante
no compasso dos sonhos, que é onde esconde
os mais escondidos medos e anseios.
Não deixes nunca que se ouça sozinho no que diz
antes de adormecer. E depois aguarda que,
na escuridão do quarto, seja ele a abraçar-te,
ainda que não te tenha revelado uma só vez o que queria.
Acorda mais cedo e demora-te a olhá-lo à luz azul
que os dias trazem à casa quando são tranquilos.
E nada lhe peças de manhã ― as manhãs pertencem-lhe;
deixa-o a regar os vasos na varanda e sai,
atravessa a rua enquanto ainda houver sol. E assim
haverá sempre sol e para sempre o terás,
como para sempre o terei perdido eu, subitamente,
por assim não ter feito.
talvez para sempre ― a casa e o cheiro dos livros,
a suave respiração do tempo, palavras, a verdade,
camas desfeitas algures pela manhã,
o abrigo de um corpo agitado no seu sono. Guarda-o
a suave respiração do tempo, palavras, a verdade,
camas desfeitas algures pela manhã,
o abrigo de um corpo agitado no seu sono. Guarda-o
serenamente e sem pressa, como eu nunca soube.
E protege-o de todos os invernos ― dos caminhos
de lama e das vozes mais frias. Afaga-lhe
as feridas devagar, com as mãos e os lábios,
para que jamais sangrem. E ouve, de noite,
a sua respiração cálida e ofegante
no compasso dos sonhos, que é onde esconde
os mais escondidos medos e anseios.
Não deixes nunca que se ouça sozinho no que diz
antes de adormecer. E depois aguarda que,
na escuridão do quarto, seja ele a abraçar-te,
ainda que não te tenha revelado uma só vez o que queria.
Acorda mais cedo e demora-te a olhá-lo à luz azul
que os dias trazem à casa quando são tranquilos.
E nada lhe peças de manhã ― as manhãs pertencem-lhe;
deixa-o a regar os vasos na varanda e sai,
atravessa a rua enquanto ainda houver sol. E assim
haverá sempre sol e para sempre o terás,
como para sempre o terei perdido eu, subitamente,
por assim não ter feito.
Claribel Alegria - Estranho hóspede
Es extraño este huésped
este amor
cuanto más me despoja
más me colma.
Estranho este hóspede
este amor
quanto mais me tira a posse
mais me enche.
este amor
cuanto más me despoja
más me colma.
Estranho este hóspede
este amor
quanto mais me tira a posse
mais me enche.
Louis-Jean-Francois Lagrenée 1724-1805
Alguns
leitores perguntaram pelo nome do autor da pintura que encima o blogue e que tem
por titulo O
Estudante de Filosofia. De notar o ângulo da
luz oposto ao ângulo do corpo, mas que nele se dissolve.
Os
livros não mudam o mundo,
quem
muda o mundo são as pessoas.
Os
livros só mudam as pessoas.
Mário
Quintana
Edward Hooper - Pablo Neruda
Ya no pensemos más: ésta es la casa:
Pablo Neruda
José Ángel Valente - Consinto
Devo morrer. E, contudo, nada
morre, porque nada
tem fé suficiente
para poder morrer.
Não morre o dia,
passa;
nem uma rosa,
apaga-se;
resvala o sol,
não morre.
Somente eu, que toquei
o sol, a rosa, o dia,
e acreditei,
sou capaz de morrer.
trad. José Bento
Aguaviva - La canción del niño que quería ir a la luna
Do tempo dos sonhos.
Quiero plantar un árbol en la Luna, madre,
Porque la hermosa Luna es sorda y fría.
Quiero tejer un nido de gorriones, madre,
En la Luna que es gris y que no alienta.
Quiero estrechar la mano al selenita, madre,
Aunque sea de piedra y de silencio.
Quiero apoyar con fuerza mis labios en la Luna, madre,
Como si fuera un tibio cutis de muchacha.
Quiero plantar un árbol en la Luna, madre.
Quiero tejer un nido de gorriones, madre.
Quiero estrechar la mano al selenita, madre.
Quiero apoyar mis labios en la Luna, madre.
Quiero que, cuando lleguen
Los sabios hombres a la Luna, madre,
Aprendan de una vez
Lo que es un árbol, un gorrión,
La mano de un amigo
Y un rostro al que se ama,
Porque los sabios hombres, madre,
Casi lo han olvidado.
Não foi possível plantar a árvore na Lua.
Quiero plantar un árbol en la Luna, madre,
Porque la hermosa Luna es sorda y fría.
Quiero tejer un nido de gorriones, madre,
En la Luna que es gris y que no alienta.
Quiero estrechar la mano al selenita, madre,
Aunque sea de piedra y de silencio.
Quiero apoyar con fuerza mis labios en la Luna, madre,
Como si fuera un tibio cutis de muchacha.
Quiero plantar un árbol en la Luna, madre.
Quiero tejer un nido de gorriones, madre.
Quiero estrechar la mano al selenita, madre.
Quiero apoyar mis labios en la Luna, madre.
Quiero que, cuando lleguen
Los sabios hombres a la Luna, madre,
Aprendan de una vez
Lo que es un árbol, un gorrión,
La mano de un amigo
Y un rostro al que se ama,
Porque los sabios hombres, madre,
Casi lo han olvidado.
Não foi possível plantar a árvore na Lua.
Lorenzo Lotto - A alegoria da virtude e do vicio
Do Irremediável
Devemos viver
a realidade de hoje
de tal forma
que o amanhã
seja a saudade
de algo de bom
que passou.
Que todo o nosso anseio
seja um presente
que, ausente no futuro
nos traga de volta
o tempo
sem o arrependimento
que fica nos frios espaços
que deixamos de preencher,
ou nas horas irrecuperáveis
que esquecemos de viver,
pois há no tempo,
algo de irremediável
no seu eterno passar:
o seu nunca mais voltar.
a realidade de hoje
de tal forma
que o amanhã
seja a saudade
de algo de bom
que passou.
Que todo o nosso anseio
seja um presente
que, ausente no futuro
nos traga de volta
o tempo
sem o arrependimento
que fica nos frios espaços
que deixamos de preencher,
ou nas horas irrecuperáveis
que esquecemos de viver,
pois há no tempo,
algo de irremediável
no seu eterno passar:
o seu nunca mais voltar.
Nota: Este quadro de Lorenzo Lotto oferece-nos uma lição sobre o valor
das virtudes e dos vícios que convivem dentro do coração humano. Ao
centro está representado o tronco da árvore do Paraíso que secou
depois do pecado original e que simboliza o eixo da evolução vertical humana,
que depende das atitudes do eixo horizontal. Nele, verdeja um rebento.
De um lado está descrito o vício: o deus Pan que toca na floresta
melodias profanas na flauta, que tem os olhos no chão porque o vinho acabou -
sem reparar que há ainda vasilhas cheias a verter; que tem patas
de bode como Satanás e que ataca sexualmente as fêmeas como um animal.
Do outro lado está um menino que simboliza a virtude: (esta deve começar
desde tenra idade), na mão tem um compasso, estuda matemática, a ciência que
conduz ao conhecimento e à razão.
Todavia, o ser humano precisa de se proteger. Daí os escudos: o
superior representa a imagem da deusa Medusa com serpentes na cabeça e um olho
mortal que petrifica quem para ela olha. Na lenda de Medusa, o deus Perseu tem
a coragem de a enfrentar, pede o espelho a Minerva e vira-o para Medusa. Esta
olha-se nesse espelho e vê o seu próprio olhar refletido caindo sobre
si própria. É esse auto-conhecimento, essa consciência, que ajuda o homem
a reconhecer o mal. O escudo inferior representa um leão que simboliza o poder
e a inteligência que nos permitem agir.
Calum Graham - The Channel
O encontro de guitarristas em The Canadian Fingerstyle Guitar Championship tem esta particularidade, os membros do júri atribuem as classificações de olhos fechados, sem ver o palco e os participantes são identificados apenas pela atribuição de um número. Não se valoriza a expressão facial e corporal, o aspecto da guitarra e do traje, mas a pureza da execução. Os ouvidos ganham aos olhos.
Eugénio de Andrade - Desde a aurora
Como um sol de polpa escura
para levar à boca,
eis as mãos:
procuram-te desde o chão,
entre os veios do sono
e da memória procuram-te:
à vertigem do ar
abrem as portas:
vai entrar o vento ou o violento
aroma de uma candeia,
e subitamente a ferida
recomeça a sangrar:
é tempo de colher: a noite
iluminou-se bago a bago: vais surgir
para beber de um trago
como um grito contra o muro.
Sou eu, desde a aurora,
eu — a terra — que te procuro.
A morte é o regresso ao ventre.
para levar à boca,
eis as mãos:
procuram-te desde o chão,
entre os veios do sono
e da memória procuram-te:
à vertigem do ar
abrem as portas:
vai entrar o vento ou o violento
aroma de uma candeia,
e subitamente a ferida
recomeça a sangrar:
é tempo de colher: a noite
iluminou-se bago a bago: vais surgir
para beber de um trago
como um grito contra o muro.
Sou eu, desde a aurora,
eu — a terra — que te procuro.
A morte é o regresso ao ventre.
Eucanaã Ferraz
Não há matéria para se fazer a tristeza
nessa manhã, manhã perfeita
se a mão que me deu maio fosse a tua.
nessa manhã, manhã perfeita
se a mão que me deu maio fosse a tua.
Poema simples
Serravam os ramos em que se sentavam
E gritavam uns aos outros as suas experiências
Como se podia serrar mais rápido, e despenhavam-se
Abanavam as cabeças ao serrar e
Continuavam a serrar.
Bertolt Brecht
E gritavam uns aos outros as suas experiências
Como se podia serrar mais rápido, e despenhavam-se
Abanavam as cabeças ao serrar e
Continuavam a serrar.
Bertolt Brecht
O epitáfio de Seikilos
"Hoson zēs,
phainou
Mēden holōs sy lypou;
Pros oligon esti to zēn
To telos ho chronos apaitei."
In English:
"As long as you live, shine,
Let nothing grieve you beyond measure.
For your life is short,
and time will claim its toll."
Mēden holōs sy lypou;
Pros oligon esti to zēn
To telos ho chronos apaitei."
In English:
"As long as you live, shine,
Let nothing grieve you beyond measure.
For your life is short,
and time will claim its toll."
O epitáfio de Seikilos legou ao nosso tempo a mais
antiga composição musical com letra e notação musical de que temos notícia. A
música encontrava-se gravada num túmulo encontrado algures na Turquia e a sua
datação varia entre II a.C. e I d.C. Embora tenhamos registo de notação musical
mais antiga, esta encontra-se em estado fragmentário.
José Agostinho Baptista - Caderno
Tudo o que fizemos e dissemos e amámos - ou
talvez nem isso -
cabe num mísero caderno onde o esplendor não
lança os seus raios.
De mais ou menos palavras se faz o tempo de
semear,
mas nenhuma colheita retomará o calor do feno,
nada que se possa tocar com a alegria dos dedos,
nada de inocente e sagrado
que nos deixe adormecer sobre o linho.
talvez nem isso -
cabe num mísero caderno onde o esplendor não
lança os seus raios.
De mais ou menos palavras se faz o tempo de
semear,
mas nenhuma colheita retomará o calor do feno,
nada que se possa tocar com a alegria dos dedos,
nada de inocente e sagrado
que nos deixe adormecer sobre o linho.
Julie Fowlis - Oganaich Uir A Rinn M'fhagail
1. Oganaich ùir a rinn m' fhàgail
Oh noble youth who has left me
Hi ri-abh o hiùraibh o ho Hi ri-abh o ro hùbhag
Hi ri-abh a hiùraibh o ho
2. Chum thu air deireadh air chàch mi
You have kept me behind all the others
3. Gun fhios dha m'athair no m' mhàthair
Unknown to my father or mother
4. Gun fhios dham phiuthar no m' bhràithair
Unknown to sister or brother
5. A bhean ud thall aig a chuibhle
Oh woman at the spinning wheel
6. Fhios agad fhèin mar a tha mo chridhe
You know how my heart is
O canto em gaélico do principio ao fim do céu.
Eugénio de Andrade - Já não se vê o trigo
Já não se vê o trigo,
a vagarosa ondulação dos montes.
Não se pode dizer que fossem contigo,
tu só levaste esse modo
infantil de saltar o muro,
de levar à boca
um punhado de cerejas pretas,
de esconder o sorriso no bolso,
certa maneira de assobiar às rolas
ou então pedir um copo de água,
e dormir em novelo,
como só os gatos dormem.
Tudo isso eras tu, sujo de amoras.
a vagarosa ondulação dos montes.
Não se pode dizer que fossem contigo,
tu só levaste esse modo
infantil de saltar o muro,
de levar à boca
um punhado de cerejas pretas,
de esconder o sorriso no bolso,
certa maneira de assobiar às rolas
ou então pedir um copo de água,
e dormir em novelo,
como só os gatos dormem.
Tudo isso eras tu, sujo de amoras.
We will all be a little like Ulysses
Ulysses is
for me the prototype of man, not only modern man, but man of the future as
well, because he represents the type of the 'trapped' voyager. His voyage was a
voyage toward the center, toward Ithaca, which is to say, toward himself. He
was a fine navigator, but destiny - spoken here in terms of initiation which he
had to overcome - forced him to postpone indefinitely his return to hearth and
home. I think that the myth of Ulysses is very important for us. We will all be
a little like Ulysses, for in searching, in hoping to arrive, and finnaly,
without a doubt, in finding again the homeland, the hearth, we re-discover
ourselves. But as in the Labyrinth, in finding one's home again, one becomes a
new being.
Mircea Eliade in, L'Epreuve du Labryinthe
Pedro Almodovar - La mala educación
Ás vezes surpreendemos o outro invertendo-o, mas apenas porque o outro nos encomendou a lição. Este video é um exemplo impressionante de com essa inversão se faz.
Jeanne Moreau - Le tourbillon de la vie
Elle
avait des bagues à chaque doigt, des tas de bracelets autour des poignets, et
puis elle chantait avec une voix qui, sitôt, m'enjôla. Elle avait des yeux, des
yeux d'opale, qui me fascinaient, qui me fascinaient. Y avait l'ovale de son visage pâle de
femme fatale qui m'fut fatale{2x}. On s'est connus, on s'est reconnus, on s'est
perdus de vue, on s'est r'perdus d'vue on s'est retrouvés, on s'est réchauffés,
puis on s'est séparés. Chacun pour soi est reparti. Dans l'tourbillon de la vie
je l'ai revue un soir, hàie, hàie, hàie ça fait déjà un fameux bail {2x}. Au
son des banjos je l'ai reconnue. Ce curieux sourire qui m'avait tant plu. Sa
voix si fatale, son beau visage pâle m'émurent plus que jamais. Je me suis
soûlé en l'écoutant. L'alcool fait oublier le temps. Je me suis réveillé en
sentant des baisers sur mon front brûlant{2x}. On s'est connus, on s'est
reconnus. On s'est perdus de vue, on s'est r'perdus de vue on s'est retrouvés,
on s'est séparés. Dans le tourbillon de la vie. On a continué à toumer tous les
deux enlacés tous les deux enlacés. Puis on s'est réchauffés. Chacun pour soi
est reparti. Dans l'tourbillon de la vie. Je l'ai revue un
soir ah là là elle est retombée dans mes bras. Quand on s'est connus, quand on
s'est reconnus, pourquoi se perdre de vue, se reperdre de vue? Quand on s'est
retrouvés, quand on s'est réchauffés, pourquoi se séparer?Alors tous deux on
est repartis dans le tourbillon de la vie on à continué à tourner tous les deux
enlacés tous les deux enlacés.
Alisa Weilerstein - Concerto op. 85 de Edward Elgar.
Alisa Weilerstein nasceu há 30 anos em Nova Iorque e toca para dentro de todos nós. O movimento do arco, os vibratos e as expressões do rosto lembram os filmes mudos.
Manuel de Falla - El Amor Brujo
El
Amor Brujo é uma obra de ballet cigano designada por ‘gitaneria’e que foi
encomendada a Manuel de Falla (1876-1939) a pedido da coreógrafa e bailarina
cigana Pastora Imperio (1889-1979), uma das maiores representantes
do folclore flamenco de todos os tempos. A obra original foi composta
para um grupo de câmara com estreia no Teatro Lara de Madrid, em 15 de Abril de
1915, sem receber o agrado geral.
Por
essa razão, poucos anos depois, De Falla compôs uma segunda versão para suíte
sinfónica e mezzo-soprano, com libreto original de Gregorio Martínez Sierra.
Agora, em ‘pantomímico ballet’ a obra revelava um caracter andaluz cru, com
momentos de beleza e originalidade em cante
jonde que incluiam a famosa
Dança Ritual do Fogo (que começou por ter o nome de ‘Dança do fim do dia’), a
Canção do Fogo Fátuo e a Dança do Terror. Os textos foram escritos em dialeto
cigano-andaluz.
A
história é tipicamente cigana: amor, traição e sangue. Candela apaixona-se por
Carmelo depois do marido morrer e o espirito deste visita-a em forma de
fantasma. A comunidade cigana em solidariedade, junta-se à noite em roda
à volta de uma fogueira. E, é neste círculo que Candela põe em prática o Ritual
da Dança do Fogo de modo a que o fantasma possa aparecer e com ela possa
dançar. À medida que gira mais e mais rápido em volta da fogueira, a magia da
dança do fogo faz com que o fantasma seja arrastado para as chamas, fazendo com
que desapareça para sempre.
De
Falla, amigo de Federico García Lorca, tentou evitar a sua morte em 1936,
durante a Guerra Civil Espanhola. Depois desta terminar, exilou-se por vontade
própria na Argentina onde veio a morrer em 1939. Os restos mortais vieram para Espanha,
em 1947, e estão sepultados na catedral de Cádis.
Em
1986, o realizador espanhol Carlos Saura passou a história de El Amor Brujo
para filme.
Nota: Para a Lara Nunes, que toca uma parte da obra na Guitarrafonia.
Saber o conteúdo é um passo importante para sentir um maior envolvimento
na interpretação.
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