Perturbam-me
as sombras da casa
os
uivos das janelas
os
olhares das fotografias nas molduras.
O
chão do corredor que range quando o atravesso
as
vozes dos vizinhos de baixo, as portas que batem.
Perturba-me
o empregado do restaurante em frente
que
me vigia quando fumo à janela.
Perturbam-me
os arrulhos dos pombos
as
obras intermináveis do prédio em frente
o
gato morto e já ressequido no quintal da vizinha
o
estar longe, o estar só.
Perturba-me
o cheiro do cinzeiro
o
chiar da porta da cozinha
o
bolor dos pimentos há meses no frigorífico.
Perturba-me
esta constipação
as
chávenas com rachas
o
não ter limões, o sangue nas mãos.
Partiu-se o frasco do mel.
Inês Ramos nasceu em 1965, Agualva-Cacém. Mantém, desde 2006 o blogue sobre poesia "Porosidade etérea", onde divulga poetas e os seus livros. Foi responsável pela recolha, seleção e organização da antologia de poesia "Os Dias do Amor", com poemas de 365 autores, editada em 2009. O poema fala-nos da sensibilidade fina, bela com mistério, em cada gesto.
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