Cecília Barreira

 

éramos cinco no apartamento do príncipe real

fazíamos longos passeios ao domingo de sono

íamos ao trumps

íamos ao plateau

e a vida era empurrada entre intervalos.

um dia tu disseste-me as palavras certas:

só vivo o momento, não sei de amanhãs

e eu que tanto queria imaginar o amanhã

fiquei perplexa

o momento e o acaso são inúteis

apetece-me empurrar os momentos todos

e dar-lhes um significado

não gosto de momentos

são episódicos

empanturram-nos de satisfação

até que de súbito queremos acordar amanhã

mas o momento não deixa

para passar o momento

comecei a tomar lexotan


      Cecília Barreira nasceu em Lisboa e quase sempre lá residiu. Fez a licenciatura em História na Faculdade de Letras de Lisboa e entrou como assistente estagiária na NOVA-FCSH no decorrer dos anos 80. Em 1984 publicou o primeiro livro de poesia pela Europress, Lua Lenta. E muitos outros livros se seguiram. Em janeiro de 2021 ousou dar à luz o primeiro livro de short stories. Há muito que sentia essa pulsão. E vive essa bipolaridade: entre a prosa e a poesia. O poema, acima, mostra-nos como viver só o momento nos faz adoecer. Importante é o que dura e se for eterno, melhor ainda.

 

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