Louise Glück - Paisagem/3



Nos fins do outono uma rapariga deitou fogo
a um trigal. O outono


fora muito seco; o campo
ardeu como palha.


Depois não sobrou nada.
Se o atravessávamos, não víamos nada.


Nada havia para colher, para cheirar.
Os cavalos não compreendem –


Onde está o campo, parecem dizer.
Como tu ou eu a perguntar
onde está a nossa casa.


Ninguém sabe responder-lhes.
Não sobra nada;
resta-nos esperar, a bem do lavrador,
que o seguro pague.


É como perder um ano de vida.
Em que perderias um ano da tua vida?


Mais tarde regressas ao velho lugar –
só restam cinzas: negrume e vazio.


Pensas: como pude viver aqui?


Mas na altura era diferente,
mesmo no último verão. A terra agia
como se nada de mal pudesse acontecer-lhe.


Um único fósforo foi quanto bastou.
Mas no momento certo – teve de ser no momento certo.


O campo crestado, seco –
a morte já a postos
por assim dizer.


      Terceira parte do poema "Landscape", de Averno (2006), traduzido por Rui Pires Cabral. Há versos que duram para sempre. 

1 comentário:

Gato Aurélio disse...

...as imagens são fortissimas.

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