Elias Moro - A Mala do Viajante

 


Nesta mala eu guardo as minhas coisas,

o velho pijama, que nunca usei, presente da minha mãe,

uma réstea de sol no ombro dela,

uma pedra que sabe da água mais do que os próprios peixes,

os primeiros dentes caídos das minhas filhas,

poemas de amigos que já não são nem estão, mas permanecem,

os olhos, também dela, quando anoitece,

um telegrama a anunciar desastre,

o casaco de lã dum amigo falecido,

uma música antiga de piano e violino,

a voz dela a falar-me de tudo isto lá onde for

e uma corda de cânhamo,

para o caso de ter de fugir de mim mesmo

ou justiçar um miserável.

Espero não me ter esquecido de nada,

sempre se esquece algo ao fechar a mala,

mas nada é importante se se esquece.


   trad. A. M. 


   La Maleta del Viajero


En esta maleta guardo mis cosas:

el viejo pijama, regalo de mi madre, que nunca me puse,

un trozo de sol en el hombro de ella,

una piedra que sabe del agua más que los peces mismos,

los primeros dientes que mis hijas perdieron,

poemas de amigos que ya no son ni están, pero permanecen,

los ojos, también de ella, cuando anochece,

un telegrama que anuncia desastres,

el jersey de lana de un amigo muerto,

una música antigua de violines y pianos,

la voz de ella para hablarme de todo esto allá donde vaya

y una cuerda de cáñamo

por si tengo que huir de mí mismo

o ajusticiar a un miserable.

Espero no haberme olvidado de nada:

siempre se olvida algo al cerrar una maleta,

pero nada es importante si se olvida.


      Elías Moro nasceu em Madrid em 1959 e reside em Mérida desde 1982. Autor de poesia e narrativa vasta tem neste poema um momento, onde preserva pedaços de memória e outros úteis para o futuro. 


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