Charles Simic - Laranja cor de sangue

 


Está tão escuro que o fim do mundo pode estar próximo.

Convenço-me que vai chover.

Os pássaros no jardim estão silenciosos.

Nada é o que parece,

Nem nós mesmos.

 

Na nossa rua há uma árvore tão grande

Que podemos esconder-nos todos nas suas folhas.

Nem precisaremos de roupas.

Sinto-me tão velho como uma barata, disseste.

Imagino-me passageiro de um navio-fantasma.

 

Agora nem um suspiro lá fora.

Se alguém abandonou uma criança no nosso patamar,

Deve estar a dormir.

Tudo está a vacilar na borda de tudo

Com um sorriso polido.

 

É porque há coisas neste mundo

Sem qualquer solução, disseste.

Nesse instante ouvi a laranja cor de sangue

Rebolar pela mesa e com um baque

Cair no chão rachada ao meio.


        O fim será o inicio de um novo ciclo: depois da noite regressa sempre o sol, depois do inverno volta a primavera, e no fim será o verbo, um verbo novo.  

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