Robert Campin - O Retábulo de Mérode



     Robert Campin (1375-1444) é considerado o primeiro grande pintor flamengo e acredita-se que tenha nascido e morrido em Tournai, na Bélgica. Este tríptico, ou painel com três pinturas, é uma das suas obras de referência. Foi provavelmente encomendado para uso privado das famílias aristocráticas belgas Arenberg e Merode e aí permaneceu, antes de ter chegado ao mercado de arte.
      Nesta verdadeira obra de arte, o mundo material e o mundo espiritual convivem serenamente em cor e motivos. A luz dos verdes, azuis, vermelhos, castanhos é intensa, mas suave. Quanto aos motivos levantam-se muitas interrogações, por exemplo, os leões nas extremidades do banco comprido simbolizam o trono de Salomão (não vem descrito nas Sagradas Escrituras, mas a tradição lateral refere que o trono do célebre rei tinha 7 degraus e em cada um dois leões) ou são apenas representações decorativas características do mobiliário medieval?


      Robert Campin, se não foi pioneiro a colocar dúvidas iconográficas, foi certamente o primeiro a representar um cenário doméstico completo num quadro de Anunciação. O todo coaduna-se com a imagem moderna de Maria, como alguém que foi humano, viveu na Terra e foi escolhida por ser a "cheia de Graça", a Mãe de Deus. 
      A posição de Maria, ajoelhada no chão, é sinal da sua humildade e os lírios na jarra sobre a mesa, simbolizam a sua castidade. 


      Junto aos lírios está uma vela recentemente apagada, de significado obscuro. A cera representa a humanidade de Cristo, o pavio a sua alma, o fogo a sua divindade. O facto de estar apagada talvez seja explicável pelas revelações de Santa Brígida: «A luz do esplendor divino anulou totalmente a luz material».


      O significado de pureza é acrescentado pelo vaso de bronze com uma toalha ao lado. Junto do vaso está uma janela de onde entram raios de luz. São Bernardo explica deste modo o próprio milagre da Encarnação: «A luz do Sol enche e penetra a janela sem a danificar e consolida a sua forma sólida com uma subtileza imperceptível, assim é a palavra de Deus. O Espírito de Deus entrou no quarto, no santo útero fechado.» São sete os raios de luz, indicando os sete dons do Espírito Santo.
     


      O jardim é certamente carregado de simbolismo. A roseira simboliza o martírio de Cristo e as rosas a própria Virgem Maria. As flores junto do canto inferior esquerdo são miosótis ("não-me-esqueças") simbolizando os olhos de Maria, mas também violetas e margaridas, signos de humildade. Lembram também que Cristo foi concebido no tempo da Primavera. O muro do jardim indica a virgindade de Maria geralmente comparada a um jardim fechado..


      Interessante é também a vista de Tournai, que se descobre no painel direito que representa a oficina de São José. Este parece que se dedicou a fabricar ratoeiras. Estas estão provavelmente ligadas ao facto de a sabedoria sobre a divindade de Cristo dever ser protegida do diabo, para que este não soubesse que Ele era mais do que um homem durante a missão que desempenhou na Terra.

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