XVIII


Os dias não se descartam nem se somam, são abelhas

que arderam de doçura ou enfureceram

o aguilhão: o certame continua,

vão e vêm as viagens do mel à dor.

Não, não se desfia a rede dos anos: não há rede.

Não caem gota a gota de um rio: não há rio.

O sonho não divide a vida em duas metades,

nem a ação, nem o silêncio, nem a virtude:

a vida foi como uma pedra, um só movimento,

uma única fogueira que reverberou na folhagem,

uma flecha, uma só, lenta ou ativa, um metal

que subiu e desceu queimando-se nos teus ossos.


      Pablo Neruda, 1904-1973, quer tenha morrido de causas naturais ou assassinado - como suspeitam alguns, viveu com amor à beleza. Quando era jovem li dele este verso "Amor, deixa-me fazer contigo o que a primavera faz às cerejeiras." e logo passou a ser eternamente meu. Este poema é sobre a aceitação da vida na sua unidade.


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