Manuel António Pina - Aos filhos

 


Já nada nos pertence,

nem a nossa miséria.

O que vos deixaremos

a vós roubaremos.

 

Toda a vida estivemos

sentados sobre a morte,

sobre a nossa própria morte!

Agora como morreremos?

 

Estes são tempos de

que não ficará memória,

alguma glória teríamos

fôramos ao menos infames.

 

Comprámos e não pagámos,

faltámos a encontros:

nem sequer quando errámos

fizemos grande coisa?


      Deixe lá, Sr. Manuel, o que recebemos também não foi grande coisa. Ou não? Recebemos tanto.


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