As folhas do damasqueiro tinham começado a cair
em Julho e depois de Agosto a Setembro.
Nós divertiamo-nos a recolhê-las uma de cada vez
e a contá-las em voz alta.
Um dizia: mil, mil e uma, mil e duas, mil e três,
o outro continuava: mil e quatro, mil e cinco, mil e seis.
A cantilena durava até à noite
e assim enchíamos três sacos.
Mas uma manhã meu irmão deixou de trabalhar,
por razões que não quis adiantar,
soube depois que se irritou
porque brincando lhe chamei cretino
por uma folha não contada.
Eu dissera: dois mil e dois e ele dois mil e quatro;
e a dois mil e três para onde foi?
Ficámos dez dias sem falar. Levantávamo-nos
de costas voltadas um para o outro e comíamos cabisbaixos;
entretanto as primeira neblinas
iam tecendo um véu de água fina sobre o dorso do capote.
À noite lançávamos aquelas folhas, um punhado cada um,
sobre o fogo e ficávamos a contemplar as labaredas.
Tonino Guerra
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