Gotthold Ephraim Lessing - A Morte




Ontem — crê-lo-eis amigo?

Dando-me ao rubro licor,

(Imaginai meu terror!)

Veio a morte ter comigo.


Brandindo a foice dest’arte

Bradou o fantasma cruel:

"Servo de Baco fiel!

Vem! Tens bebido que farte."


E eu chorando: "Ó cara Morte

Já vos eu apeteci?

Tomai um copo daí

Não deis inda o fatal corte."


C’um sorriso vinho bota,

Diz, erguendo o copo ao ar:

"Viva a Peste! e a virar."

E dum trago vaso esgota.


Eu já quite me julgava,

Eis que torna ela a dizer:

"Pobre louco! e podes crer

Que por vinho te largava?"


— "Ah! suspende por piedade;

Medicina estudarei

E juro que te darei

De meus doentes metade."


— “Está dito: sem ti me parto,

Bebe e beija até fartar,

Vir-te-hei depois buscar,

Já de vinho e beijos farto."


— "Que suave linguagem!

Que nova vida me dais!

Vá um copo, um copo mais

À nossa camaradagem!"


Vida eterna já adivinho,

Sim pelo Deus do licor!

Não serei farto de amor,

Nem jamais farto de vinho!


    Tradução de José Gomes Monteiro

      Poeta do iluminismo alemão, Gotthold Lessing (1729-1781) ilustra-nos neste poema faustiano, com o título Der Tod (A Morte), o desejo humano de continuar permanentemente a viver. Qual jogo bergmaniano em O Sétimo Selo. Nos argumentos que dão sentido à vida, vamos encontrar a postura hedonista dos nossos dias de que viver a vida, vale a pena, se for para ter prazer. E no caminho, para o conseguir, vale tudo.

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