Maria de Lurdes Resende - Moleirinha




Música de Tomás Borba e versos de Guerra Junqueiro.

Pela estrada plana, toc, toc, toc,
Guia o jumentinho uma velhinha errante
Como vão ligeiros, ambos a reboque,
Antes que anoiteça, toc, toc, toc
A velhinha atrás, o jumentinho adiante!

Toc, toc, a velha vai para o moinho,
Tem oitenta anos, bem bonito rol!
E contudo alegre como um passarinho,
Toc, toc, e fresca como o branco linho,
De manhã nas relvas a corar ao sol.

Vai sem cabeçada, em liberdade franca,
O jerico ruço duma linda cor;
Nunca foi ferrado, nunca usou retranca,
Tange-o, toc, toc, moleirinha branca
Com o galho verde duma giesta em flor.

Toc, toc, é tarde, moleirinha santa!
Nascem as estrelas, vivas, em cardume
Toc, toc, toc, e quando o galo canta,
Logo a moleirinha, toc, se levanta,
Pra vestir os netos, pra acender o lume.

Toc, toc, como o burriquito avança!
Que prazer d'outrora para os olhos meus!
Minha avó contou-me quando fui criança,
Que era assim tal qual a jumentinha mansa
Que adorou nas palhas o menino Deus.

Toc, toc, é noite... ouvem-se ao longe os sinos,
Moleirinha branca, branca de luar!
Toc, toc, e os astros abrem diamantinos,
Como estremunhados querubins divinos,
Os olhitos meigos para a ver passar.

Guerra Junqueiro (1850 - 1923)
(Do livro de leitura da 4ª classe de 1951)

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