The Vessel






É um filme belo onde nenhuma sequência é gratuita. E o que é esse belo? Justamente aquilo que extrapola a nossa capacidade de negociação com a vida, e com a morte, munidos dos instrumentos que ao longo da história da humanidade fomos amealhando como escudos para a luta inglória com o inevitável: a ideia de que Deus não nos dará uma cruz maior do que a que pudermos carregar, nem qualquer dor que não teremos condição de suportar sob a sua protecção e amparo; e de que tudo o que nos acontece, de bom e ruim, é porque Deus assim quis, para nosso bem, para fortalecer a nossa fé nele e numa vida eterna.
O que se segue a essa explosão de loucura é o que transforma The Vessel num filme singular e imprescindível, parte da nossa vocação em reconhecer a nossa verdadeira condição: navegantes numa casca de noz, passíveis de submergir num mar repleto de perigos, num ambiente onde sequer conseguimos compreender para acreditar.
Porém, o que nos impele a continuar a navegar, mesmo conscientes das ameaças, mesmo em circunstâncias tão adversas, é também o que nos fortalece na nossa viagem. E é igualmente o que promove os encontros verdadeiros com nossos semelhantes, que nos trazem a interlocução e a lucidez capazes de nos fazer reconhecer que o que atribuímos à vontade de algum Deus na verdade é o nosso próprio desejo de viver, de navegar, enquanto houver vida, enquanto houver mar, e enquanto houver quem deseje navegar junto connosco.

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