Rogelio Guedea - O ofício


As palavras não encontram o quarto.
Passam duma sala a outra embrulhadas num lençol branco,
como a louca da vila.
Falta-lhes apenas uivar.
Quero dizer, uivam como as ambulâncias
na noite de George Street.
Sofrem de insónia.
Mudam intempestivamente os canais da televisão.
Comem pão duro, de desesperadas.
Não falo do que escreve.
Eu não faço as metáforas do escrevente.
Falo das palavras e do seu exercício de nascer.
Do difícil que é vê-las chegar a um país onde as outras palavras
conduzem pela esquerda
e onde são realmente caros os abafos de lã que poderiam,
em todo o caso, protegê-las do frio.

Sem comentários:

Arquivo do blogue