A. M. Pires Cabral



Aquele que trazia uma vinha guardada
na gaveta da alma de mais fácil acesso
e sempre aberta – não pode ter morrido.

Para facilitar, digamos que emigrou
com juras de algum dia regressar,
voltar a ver o rio, afagá-lo
como se afagam as cãs de um velho pai.

Felizmente para nós,
não pôde levar na mala breve
os seus papéis, os seus livros, a viola
que dedilhava em pensamento
e nos fazia dedilhar a nós.

De modo que, enquanto não regressa,
a sua voz continua a nosso lado,
indicando caminhos, desbravando
matagais que ocultam a esperança.

in, Gaveta do fundo

      Este poema de um óptimo escritor transmontano, lembra-me o meu pai, que gostava do cultivo da vinha e que um dia tocou guitarra para mim.

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